3 de ago. de 2010

Política e religião

Obra tenta entender ação política de evangélicos


Vale a pena ler a resenha de Oscar Pilagallo, publicada na Folha, em que ele comenta a participação dos evangélicos na política.

Segue...

A redução pela metade da bancada evangélica no Congresso, para 30 deputados, em decorrência do envolvimento de pastores parlamentares em escândalos, poderia desqualificar um livro sobre a maior participação dos pentecostais na política. Não é esse, porém, o caso de "Política e Religião", de Maria das Dores Campos Machado, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro.

Para começar, o fiasco não surpreendeu a autora, cujo estudo sobre o desempenho dos legisladores evangélicos fluminenses entre 2000 e 2005 leva em conta o revés eleitoral anterior, de 2004, quando o número de vereadores ligados à Igreja Universal do Reino de Deus, por exemplo, caiu de 360 para 70 no Brasil. E, de qualquer maneira, embora a atuação de pastores congressistas fosse a crônica da derrota anunciada, não é esse o recorte da socióloga.

Ela está mais interessada em discutir a reação de intelectuais diante da aparição dos pentecostais na arena política a partir dos anos 80. De saída, coloca em xeque a interpretação, comum entre cientistas políticos, de que tal tendência representa retrocesso na secularização desse aspecto da vida social.

Retrocesso por quê, se a Igreja Católica sempre atuou de maneira a tornar difusa a linha demarcatória entre religião e política. Levando-se em conta a perspectiva histórica, seria equivocado identificar no passado recente a emergência do fenômeno religioso na política. O que houve foi a ampliação da área sobreposta dessas esferas, algo que não pode ser entendido, segundo a autora, sem o abandono do "viés ideológico que caracteriza como ilegítima toda e qualquer atuação pública das religiões".

Pragmatismo

No lugar de ideologias, ela põe fatos: o que importa é verificar como, pela via política, os pentecostais se articulam com a sociedade. E o que vem à tona com a investigação é que a chamada bancada evangélica transformou-se num grupo bem menos monolítico do que a denominação sugere.

A defesa em bloco do ponto de vista conservador e tradicional é coisa do passado. Hoje, fala mais alto o pragmatismo que vai ao encontro dos interesses assistencialistas que estão na base da ação voltada a um universo de fiéis, em geral de baixa renda e instrução.

É esse pragmatismo que explica a adesão ao governo, a troca freqüente de partido e as divergências em questões centrais, como a Lei de Biossegurança. O relato da aprovação dessa lei, aliás, é um dos pontos altos do livro.

A autora descreve um culto no Congresso em que o projeto, que permite pesquisa com célula-tronco, é associado a "ações demoníacas" pouco antes de muitos evangélicos, sob influência do Planalto, votarem a favor. Se o estatuto da religião no mundo moderno tem suas complexidades, o livro tem o mérito de enfrentá-las sem preconceito

OSCAR PILAGALLO é jornalista, editor da revista "EntreLivros" e autor de "A História do Brasil no Século 20" (em cinco volumes, pela Publifolha)

A resenha, publicada na Folha, foi realizada a partir do livro POLÍTICA E RELIGIÃO - A PARTICIPAÇÃO DOS EVANGÉLICOS NAS ELEIÇÕES, de Maria das Dores Campos Machado.

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